Há séculos, as mulheres fazem loucuras em prol da beleza. É só lembrar dos espartilhos, dos pés enfaixados das japonesas, das anfetaminas para emagrecer custe o que custar... Ao que tudo indica, a escova progressiva é mais uma dessas temeridades. Em maio deste ano, a Associação Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) deixou claro que não existem produtos autorizados por ela para esse fim e que o formol, um dos componentes utilizados pelos fabricantes, é altamente tóxico. "A quantidade máxima permitida em cosméticos, como xampus e condicionadores, é de 0,2%", diz Josineire Melo Costa Sallum, gerente-geral de cosméticos da Anvisa. Acontece que, nessa dosagem, ele não alisa. Logo, os produtos para a escova progressiva contêm muito mais formol do que o permitido. Em geral, os cabeleireiros admitem usar misturas com 2 a 4% da substância, mas eles podem estar ultrapassando ainda mais o limite, já que não sabem a quantidade exata contida nas fórmulas clandestinas. Há, também, fabricantes que exibem registro falso. Pior ainda: muitos profissionais fazem as próprias alquimias, que podem ser bombásticas. "Embora a venda de formol em farmácias seja proibida, várias burlam a lei. Então, há quem compre e acrescente indiscriminadamente às máscaras", revela o dermatologista Valcinir Bedin, do Instituto de Pesquisa e Tratamento do Cabelo e da Pele, em São Paulo.
A opinião de quem se submete ao tratamento é quase sempre a mesma: dá brilho, balanço, maciez e naturalidade por aproximadamente 30 dias. Quem costumava acordar com o cabelo em pé, todo arrepiado, e se desesperava ao menor sinal de garoa agora sai da cama sentindo-se uma princesa e enfrenta a umidade sem pânico. E realiza seu sonho pagando bem menos do que desembolsaria pela escova definitiva (a diferença às vezes chega a mil reais) e com uma economia substancial de tempo (duas horas contra sete). Diante disso, algumas mulheres avançam o sinal vermelho e procuram um meio de driblar a proibição. Convocar o cabeleireiro "delivery", que faz o trabalho em domicílio, já virou moda. A promotora de eventos Geórgia Jácome, 23 anos, foi além. Pegou uma receita da internet, no Orkut, comprou formol, solução a 37%, em uma farmácia, misturou a um creme e aplicou no cabelo sozinha. Geórgia teve sorte. Não sofreu as conseqüências associadas ao formol: ele pode provocar irritação nos olhos, nas narinas, dor de cabeça, queda de cabelo, feridas no couro cabeludo, intoxicação e problemas respiratórios. Se a pessoa se expuser com freqüência, os riscos aumentam, incluindo lesão na córnea, coma e morte. É possível também que o efeito cumulativo da substância comprometa o crescimento dos fios. "Mas ainda não há nada comprovado nesse sentido", afirma Valcinir.
Maus fluidos
Mostramos o que há por trás da marcação cerrada do Ministério da Saúde contra a técnica e pedimos a um especialista para analisar o cabelo de duas leitoras que não resistiram à tentação do alisamentoSegundo Lílian Rothschild, professora do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), na Europa e nos Estados Unidos foram estabelecidos limites para a exposição ao formol devido ao seu potencial cancerígeno. Em ambientes onde se lida com a substância, por exemplo, não pode haver no ar mais do que 0,019 miligrama por metro cúbico. Parte do formol que os cabeleireiros manipulam se transforma em vapor a partir do momento que entra em contato com o ar. "Com o calor do secador e da chapinha, o processo é potencializado. E bastam concentrações menores do que 0,012 miligrama por metro cúbico para causar irritação nos olhos e lacrimejamento", explica Lílian. A tudo isso estão sujeitos os funcionários que passam o dia no salão e fazem de seis a sete escovas progressivas por dia. Tem mais: "Em casa, os riscos aumentam, porque não se toma nenhuma precaução. A química fica impregnada no ambiente e pode comprometer a saúde de todos da família, até dos animais", alerta Maria Valéria R. Velasco, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo.
fonte: Revista Claudia
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